domingo, 8 de setembro de 2013

O Som ao Redor (uma crítica mais pessoal e menos técnica)


Ambientado no Recife, o Som ao Redor trata bastante sobre nós – recifenses – ao escancarar as aflições mais explícitas e os medos mais intrínsecos, e neste aspecto, o filme não é nada sutil, mas isto não é de forma alguma uma crítica. Ele brilha ao transformar nossos medos sociais em pesadelos rotineiros na vida de uma menina da trama; ao colocar o contato patrão e empregado análogo a uma época escravista distante e, claro, utilizando o som estridente que nos enfurece no dia a dia de forma tanto diegética (vinda daquele mundo fílmico, escutado e provocado pelos os personagens) como na trilha sonora, deixando claro que em nenhum momento escaparemos deste desobediente som. Fora estes tantos pontos positivos, é na forma de narrar onde O Som ao Redor realmente brilha.

Ao não se restringir narrativamente à apenas um personagem, a película pode abordar um mosaico de figuras: alguns de maneira profunda, outros, superficialmente - lidando com seus problemas da mesma forma como nós lidaríamos. Quando a narrativa caminha no interior de Pernambuco com duas figuras superficiais que tomam banho de cachoeira e brincam em um cinema antigo, mas restringe um tempo ínfimo para um menino de rua, este é o mesmo interesse narrativo que devotamos ou devotaríamos a esses personagens em um mundo real. 

Muitos caminham horas no shopping e leem notícias vazias a respeito de famosos efêmeros, mas os minutos depositados naqueles que sofrem se reduzem a impostos e a um olhar misericordioso direcionado para fora da janela do carro. Já fiz isto também, mas quando comecei a pensar conscientemente naqueles que sofrem nas ruas, tais figuras se tornaram reais (mais humanas) tanto de dia quanto de noite na minha mente; e as caminhadas em centros de compras ficaram cada vez mais, dolorosas, irritadiças, acinzentadas.

Por ter consciência da exclusão social que um menino de rua sofre, racionalmente, posso aplaudir quando o diretor o transforma em um ser animalesco e fantasmagórico que dorme nos galhos de árvores e, quando corre, vira-se vulto, porque é assim que estes se comportam no nosso inconsciente. Você; não sei. Mas meus pesadelos são constantes e, em inúmeras vezes, se resumiram a assaltos amedrontadores, que de forma similar aos da menina do filme só percebi que eram sonhos algum tempo após acordar.


Camuflado na narrativa existe uma história de vingança – típica do Western - que serve para nos colocar um ponto de interrogação moral. (Pare de ler aqui se você não viu o filme). Ao defender as atitudes criminosas de um de certo personagem que mata brutalmente o “senhor de engenho”, dono de uma grande parte do bairro, estaríamos aceitando nossa própria punição ou a punição destes que nos desperta ojeriza. Não acho que este é o caminho que deveríamos traçar, mas é claro que é uma interrogação pertinente. 

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